Sobre o Parlamento



Por Raimundo França

Há um jargão interessante na Ciência Política sobre as qualidades de um bom governo: diz-me quem são teus parlamentares, que te direis como será teu governo.  Tal expressão é muito oportuna para compreendermos os governos passados, os presentes e os futuros, por inúmeras razões, mas me deterei a apenas duas delas:
A primeira, diz respeito à essência da democracia eleitoral que, a rigor, deveria proporcionar igualdade de condições nas disputas eleitorais, o que sejamos sensatos, não há vestígios que tais condições existam na práxis política, pois quando observamos as regras do jogo eleitoral, estas se revelam extremamente desiguais, principalmente no que se refere ao financiamento de campanha. Aliás, este estabelece outra máxima do nosso sistema eleitoral, qual seja: quanto maiores forem os recursos financeiros que o candidato dispuser, maior será sua chance de lograr êxito eleitoral.  Logo, pouco importa a proposta política do candidato.  Sabendo disso, alguém que queira, de fato, contribuir com o bem comum dificilmente entrará numa seara tão inóspita como essa, pois saberá de antemão qual será o resultado;
A segunda questão é que o desinteresse [motivado, em geral, pela desigualdade financeira na competição eleitoral e pelo analfabetismo político – para usar corretamente a expressão de Brecht] - pelo Parlamento, por parte dos cidadãos, compromete sobremaneira a qualidade da própria democracia. Sabe-se como aponta John Locke, diferentemente de Montesquieu, que defendia a autonomia e o equilíbrio entre os poderes O Parlamento é o maior e mais representativos dos três poderes [Judiciário, Legislativo e Executivo] numa sociedade democrática, posto que nele deveria [grifo nosso] estar representados todos os segmentos sociais. Mas que isso, é no Parlamento o espaço privilegiado para o debate, para proposição e a formulação de leis e de toda forma de regulação social legal. Contudo, não só no Brasil, mas, em quase todos os países, o Parlamento tem sido relegado pelos cidadãos a um segundo ou terceiro grau de importância, o que é extremamente nocivo para qualidade de qualquer democracia ou ideal democrático.
Compreender tais questões é de fundamental importância para entendermos ao longo da própria história do Brasil, o porquê da “renúncia” dos cidadãos ao Parlamento, da dissonância entre o Parlamento e a própria sociedade, bem como a forma como os diferentes governos (passados, presentes e futuros) empreendem suas práticas e teorias de governabilidade, cuja negociação pelo alto e em segredo dá a dinâmica do processo político brasileiro. Mas, também, revela ser urgente que os cidadãos deem maior atenção ao Poder Legislativo/Parlamento como elemento crucial para melhoria do sistema democrático. 
Do contrário, continuar-se-á a ver as elites políticas híbridas ou não, dando os rumos do seu bem comum ao bem comum geral, com a conivência oportuna dos diferentes grupos políticos que buscam a conquista e a conservação do poder político.  Logo, um Parlamento atrofiado, sem autonomia e refém de seus financiadores, condiciona os governos à negociação rasteira e, na maioria das vezes, corrupta, como temos visto, para ser econômico, ao longo dos últimos trinta anos.
Não pretendo com isso imputar todos os males de nosso sistema político ao Parlamento, mas chamar atenção para importância deste Poder para consolidação da própria República, bem como para construção de uma democracia mais sólida. 
Portanto, nessas eleições tenhamos mais atenção à disputa pelos cargos parlamentares e não só aos cargos majoritários (Presidente, Governadores e Senadores), pois sua escolha definirá não só a composição, como disse no início deste texto, mas, em grande parte, as qualidades dos futuros governos e, portanto, os sentidos do bem comum.






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